Gostaria de saber o seguinte: eu abri uma empresa e tive que fecha-la, porém o CNPJ desta empresa ficou sujo. Mais tarde, procurei uma concessionária para comprar uma moto e não obtive direito ao crédito, porém não me deram os motivos, mesmo eu tendo utilizando o CPF para comprar a moto e já estando registrado em um serviço. Minha dúvida é a seguinte: se eu tiver o CNPJ sujo, o CPF também fica sujo, ou são vidas jurídicas distintas?
Obrigado pela atenção!
Max T.
Bom dia, Max!
Há duas questões que merecem ser analisadas no seu caso. A primeira se refere ao contexto geral; a segunda, ao seu caso específico.
1)
Na concessão de crédito, que geralmente é feita pelas concessionárias ou demais
empresas mediante um banco, sempre se analisa o risco da operação, e é possível
negar um empréstimo pessoal ou financiamento de veículo quando há razões justas
para presumir a possibilidade de inadimplência.
Efetivamente,
as dívidas da pessoa jurídica não se transferem para as pessoas físicas fora
dos casos permitidos em lei, por exemplo, quando há negligência no cumprimento
de compromissos legais (como a manutenção de contabilidade, cumprimento de
obrigações tributárias acessórias), fraude ou confusão patrimonial entre os
bens da pessoa jurídica e de seus sócios ou administradores. Também no caso da
firma individual, a pessoa física responde pelos atos da empresa com a
totalidade dos seus bens.
Portanto,
para saber se há justo motivo para que o banco transfira o conceito de crédito
da pessoa jurídica para a pessoa física, no seu caso, é necessário observar -
uma vez que os demais casos dependem de prova que o banco não pode obter de
maneira simples - se nos atos de constituição da sua empresa você tinha poderes
de administração.
Caso
tivesse, uma vez que a falta de cumprimento dos compromissos da empresa poderia
ser imputada à negligência na gestão, existiria motivo razoável para a concessionária
ou o banco conveniado lhe negarem o crédito, visto que existe certa dose de
pessoalidade (no sentido da pessoa natural ou física) nos atos praticados por
você na gestão da empresa, que autoriza o credor a presumir um risco de crédito
em relação a sua pessoa.
No
entanto, se você era apenas cotista sem poderes de administração, não existiria
nenhum motivo razoável para a extrapolação, aplicando-se o princípio geral da
distinção entre pessoa física e pessoa jurídica.
Para
dar um exemplo, recentemente a Turma Nacional de Uniformização dos juizados
especiais decidiu que no caso de um segurado do INSS que era sócio-administrador
de uma firma e faleceu sem pagar as suas contribuições nos últimos dois anos, a
viúva não poderia pedir a pensão por morte com o pagamento dos atrasados
(contribuição pós-morte) exatamente porque o falecido tinha poderes de administração
na empresa. Se não tivesse, mesmo sendo sócio, o benefício poderia ser
concedido.
Isso
deixa clara a extensão dos efeitos dos poderes de administração em uma pessoa
jurídica. A legislação civil/comercial moderna
também impõe penalidades pessoais a diretores de empresas que praticam fraudes,
atuam com negligência ou agem fora dos limites do objeto social da empresa,
responsabilizando-os civil e penalmente, conforme o caso.
Portanto,
a distinção entre as pessoas jurídica e física é regra geral, mas tem suas
exceções.
Resumindo,
se você tinha poderes de administração, o remédio para a situação como um todo é
procurar resolver a pendência da empresa, se for possível, ou aguardar o prazo
prescricional das dívidas. Se
não tinha, a extrapolação é injusta, mas mesmo assim você tinha o direito de
ser informado pela concessionária. Isso faz parte do segundo ponto de que
falamos acima.
2)
A concessionária não pode lhe negar o financiamento sem prestar as informações acerca
do motivo, visto que está obrigada, nos termos do artigo 39, inciso II, do
Código de Defesa do Consumidor, a
satisfazer a demanda de qualquer pessoa que a procure em situações semelhantes
e na medida de sua disponibilidade de estoque.
....
II - a educação e divulgação sobre o consumo
adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a
igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os
diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade,
características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que
apresentem;
No primeiro caso, a concessionária
teria de tratá-lo com igualdade em relação aos demais clientes, visto que você
não tem restrição no CPF e tem emprego em carteira, e assim por diante.
Havendo o temor de inadimplência por causa da situação cadastral de sua empresa, isso teria que lhe ser informado. Em recente decisão, o STJ condenou um banco que havia usado informações cadastrais secretas ( o chamado cadastro interno) para negar um financiamento a um cliente. A dívida estava prescrita, mas o banco mantinha um cadastro interno, que não é revelado ao cliente e não aparece nas consultas aos serviços de proteção ao crédito.
Desta forma, como não houve informação
sobre a recusa, você poderá ajuizar uma ação para que a concessionária lhe
venda a moto com base na sua situação cadastral e na igualdade das contratações
ou justifique por que não o faz. Nessa ação é possível cumular o pedido de
reparação de danos morais e materiais.
Os danos morais de lhe negar financiamento sem informá-lo, submetendo-o a constrangimento, não precisam ser provados, pois são inerentes ao fato (dano in res ipsa), mas se você teve danos materiais esses precisam ser determinados e quantificados na petição inicial ou, se forem danos emergentes, que ainda poderão surgir e só poderão ser quantificados futuramente, será possível pedir sua reparação para que a especificação e a quantificação sejam feitas na fase posterior à sentença, numa forma de liquidação (cálculo do valor da condenação) denominada liquidação por artigos.
Os danos morais de lhe negar financiamento sem informá-lo, submetendo-o a constrangimento, não precisam ser provados, pois são inerentes ao fato (dano in res ipsa), mas se você teve danos materiais esses precisam ser determinados e quantificados na petição inicial ou, se forem danos emergentes, que ainda poderão surgir e só poderão ser quantificados futuramente, será possível pedir sua reparação para que a especificação e a quantificação sejam feitas na fase posterior à sentença, numa forma de liquidação (cálculo do valor da condenação) denominada liquidação por artigos.
Embora a lei lhe permita formular seu pedido diretamente e os JECs forneçam um advogado dativo para acompanhar a audiência de instrução, na qual se ouvem as partes e testemunhas, se não houver acordo na primeira audiência de conciliação, estar acompanhado de um advogado que tenha dedicação especial ao seu caso é sempre conveniente e recomendável.
abs