Páginas

11 de outubro de 2012

Juros Abusivos



Bom dia, Dr.

Falta um mês para eu terminar o pagamento de um contrato de financiamento de um carro que comprei Zero Km. 

Paguei algumas parcelas em atraso e foram cobrados juros de mais de 20% em cada parcela atrasada, muito mais do que os juros de cerca de 3% ao mês do financiamento.

Isso é legal? Tenho como recuperar esse dinheiro? 

Os juros de 3% ao mês também não estão altos demais? 

Não é agiotagem cobrar juros de mais de 1% ao mês?

Obrigado
Fernando L.


..........................................................................................................

Bom dia, Fernando!

Há dois tipos de juros envolvidos num financiamento: os juros compensatórios, com os quais as instituições financeiras obtêm a remuneração do capital que investem, e os juros moratórios, que são cobrados em caso de atrasos nas parcelas.

As taxas de juros compensatórios cobradas nos financiamentos, em tese, podem ser livremente contratadas entre os bancos e os clientes, mas, na verdade, não é o que acontece, pois os bancos apresentam aos consumidores contratos de adesão, que são contratos nos quais o consumidor não pode discutir as cláusulas, mas simplesmente aderir ou não.

No entanto, o Banco Central (Bacen) divulga, periodicamente, uma tabela de juros médios para vários tipos de operações financeiras. Se os juros compensatórios estiverem muito acima desta tabela, é possível uma ação revisional para adequar o contrato ao limite da taxa média do Bacen.

Outra questão envolvida é que os bancos aplicam, desde a edição da Medida Provisória 1963-17 de 01 de março de 2000, a capitalização mensal dos juros nos contratos de financiamento. 

Significa que a cada mês os juros devidos são somados ao montante que falta amortizar, decorrendo a cobrança de juros sobre juros (anatocismo), que era considerada ilegal pelos tribunais até a edição da referida medida provisória, por força da súmula 271 do STF.  

Atualmente, o Supremo Tribunal Federal está apreciando  Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.316 em face da MP 1963-17/2000, e seu resultado deverá ser aplicado a todos os contratos. 

Por ora, ainda está sendo apreciado o pedido de liminar contra a MP, e os juros capitalizados mensalmente estão sendo cobrados em todos os contratos. 

No caso de uma ação revisional, é possível questionar a cláusula contratual que estabelece tais juros, mas nesse ponto a questão poderá ficar pendente até o resultado da ação de inconstitucionalidade no STF.

Quanto aos juros moratórios, que geralmente não ultrapassam 1% ao mês, costumam ser cobrados junto de correção monetária, multa e comissão de permanência, o que faz com que em muitos casos os encargos moratórios ultrapassem 20% ao mês, como é o seu caso.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento segundo o qual não é possível cumular juros de mora, juros remuneratórios e multa com a comissão de permanência, que gerou a seguinte súmula (resumo do entendimento do tribunal após várias decisões no mesmo sentido, que não obriga os juízes a seguirem-na, mas influencia suas decisões):

SUMULA 427 - “A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.”

Ou seja, ou a instituição financeira cobra a comissão de permanência com a correção monetária ou cobra os demais encargos.

Como os bancos geralmente não obedecem isso, é possível, numa ação revisional, cumular o pedido de restituição do que for cobrado a maior pela indevida cumulação de encargos.

Quanto ao limite dos juros a 12% ao ano, o STF afastou a auto-aplicabilidade do §3º do art. 192 da Constituição Federal, que limitava expressamente os juros em 12% (doze por cento) ao ano. O dispositivo dizia o seguinte:

  § 3º As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar.

Na ADIN 4-DF, o STF decidiu que o parágrafo 3º, do art. 192, da CF/1988 carecia de regulamentação por uma lei complementar, por causa da expressão “nos termos que a lei determinar”.

Mais tarde, a Emenda Constitucional 40, de 2003, revogou todos os parágrafos do artigo 192 da CF, numa evidente demonstração da força do sistema financeiro junto ao Poder Legislativo.

Portanto, o único instrumento de controle que restou ao consumidor foi a taxa média de juros do BACEN, que pode ser consultada em http://www.bcb.gov.br/?txcredmes

abs